segunda-feira, 19 de agosto de 2013

In on it: completamente envolvida - Ensaio



Em época de POA em Cena vale a pena relembrar...

Assisti ao espetáculo In on it em Setembro de 2010 durante a 17ª Edição do Festival Porto Alegre em Cena. É sempre um presente ver o trabalho do Enrique Diaz, que conheço do mesmo festival de outros carnavais. Não sei dizer qual foi a primeira vez que sua direção criativa, simples e viva me pegou de jeito. Se foi em A paixão segundo G.H. que me fascinou pela PAIXÃO que tenho por Literatura, se foi em Melodrama ou, talvez, em Ensaio.Hamlet, cuja Ofélia jamais esqueço com suas dezenas de cartas, seu garrafão de vinho azul com o qual ela “se afogava” e um Hamlet de All Star vermelho, número 34 (porque pra mim era 34!). Ou, ainda, minha surpresa ao ver o ator Fernando Eiras (LINDO!) na plateia antes de começar a peça comentando assim, que nem um vizinho de porta de apartamento: Nossa, que estranho, senti um arrepio... Sabe que eu tenho medo de Fantasma. (Tempo) Pois é, Hamlet é uma peça de fantasma... - Ele falava de um jeito tão cotidiano que eu pensei: “Putz! Ele tem razão! Nunca tinha pensado nisso, não desse jeito!” O fato é que sempre que vejo o nome Henrique Diaz no Festival, garanto o ingresso e, lá no fundo, meu sonho de consumo é ser dirigida por ele quando crescer.

Mas, voltando a In on it: Duas histórias se constroem no palco, situações propostas, trilha deliciosa de ouvir e com função no espetáculo. E mais a iluminação pontual do Maneco, outra criatura talentosa, cujo trabalho também conheci no Porto Alegre Em Cena. Uma feliz combinação de elementos e, ao mesmo tempo, um palco limpo. Teatro São Pedro sem cortinas, outro sonho de consumo.





Dois homens, duas cadeiras e um casaco. Minha primeira reação: o que não faz um casaco bem usado no teatro? Lembrei imediatamente do espetáculo Le Costume, de Peter Brook, em que uma personagem com o casaco esquecido pelo amante posto em metade do seu corpo interpretava o amante e acariciava a si mesma, de forma poética e quase maliciosa.
Os dois homens contam uma história cujo personagem principal usa o tal casaco, mas os dois homens também têm uma história. E essa história é de amor. Sim, são gays! - Isso chama a atenção da platéia, parece inusitado, mas contemporâneo. - De repente, os dois brigam porque um está usando o “casaco” do outro. Agora o casaco não é mais personagem, tem dono! Esse é apenas um exemplo da teatralidade do espetáculo que, com poucos recursos bem utilizados na hora e na medida certa, tomam vida e cumprem a função de construir a ficção. Uma chave de carro verdadeira no final e nada mais. Mas antes disso, acontece muita coisa.
O espetáculo me envolveu de tal maneira que, enquanto estava ali me deleitando com o talento, a precisão e a naturalidade dos atores Fernando Eiras (o mesmo ator de Ensaio.Hamlet) e Emílio de Mello foi como se passasse um turbilhão de coisas na minha cabeça, no meu coração e na minha alma. E confesso que me permiti tal turbilhão devido ao próprio título da peça que, segundo nota da tradutora do texto, Daniele Ávila:

A expressão “in on alguma coisa” quer dizer estar envolvido, estar por dentro, é quase um “ter culpa no cartório”, mas não chega a tanto. Pode ter uma conotação de ilegal ou, pelo menos, suspeito. Indica uma espécie de envolvimento que sugere uma responsabilidade, uma participação. A dramaturgia guarda isso, esse trunfo, até o fim: não se trata apenas de contar uma história que aconteceu com um personagem, mas de perceber o que move o outro personagem a contar essa história: ele está totalmente “in on it”. Assim, “in on it” é quase um estado, um ponto de partida e uma motivação. Difícil achar um título em português que tivesse tanta carga de significado em tão poucas letras. Fonte: http://inonit.wordpress.com/2009/04/27/nota-da-tradutora-1/

Sim, estou envolvida, motivada e tenho culpa no cartório. Vendo o espetáculo, eu pensava: é esse tipo de teatro que quero fazer, por que não estou fazendo? Ou, ainda, onde foi que eu me perdi, ou por que é tão difícil ser simples? Escutava as palavras do texto, escutava a história, via aquela dramaturgia calcada no jogo dos atores, e queria mais. E tinha mais, uma transcendência, uma coreografia divertida, um telefonema equivocado, uma fala do tipo: “vamo fudê” e outra: “Será que esse final tá bom?” Tudo muito preciso, dentro do timing, os atores ali, falando com a platéia, fumando um cigarro que chega à minhas narinas e ataca minha puta rinite. Vendo o espetáculo, eu fazia mais relações. Lembrei do Roberto Birindelli me dizendo: “Quando você conta uma história, você se relaciona com ela, ela te provoca alguma coisa. Traga essa história pra perto de você! O que, em você, tem a ver com essa história?” E pensei: “Era isso que ele estava dizendo! Era disso que ele falava”.

Durante o andamento do espetáculo, quando percebi que um dos atores que estava contando a história de um personagem que vai morrer, também morre, lembrei da Professora Maria Lucia Raymundo na aula de Interpretação Teatral do DAD (Departamento de Arte Dramática da UFRGS). Lucinha, como era chamada, nos perguntava: “Qual é o momento em que nos sentimos realmente vivos?” E, de repente, parei tudo e pensei no meu pai que morreu em um acidente de moto e percebi que nunca tinha pensado no que ele sentiu naquele momento. Tentando imaginar/sentir tal sensação, me senti mais perto dele. 

- O que será que ele sentiu?
Não consigo dizer mais nada, estou completamente envolvida.

IN ON IT

                                                                 Elisa Lucas
Porto Alegre, setembro de 2010.

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